miércoles, febrero 14, 2007

Na Minha Terra



Amo o vento da noite sussurrante
A tremer nos pinheiros
E a cantiga do pobre caminhante
No rancho dos tropeiros;
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E os monótonos sons de uma viola
No tardio verão,
E a estrada que além se desenrola
No véu da escuridão;
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A restinga d'areia onde rebenta
O oceano a bramir,
Onde a lua na praia macilenta
Vem pálida luzir;
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E a névoa e flores e o doce ar cheiroso
Do amanhecer na serra,
E o céu azul e o manto nebuloso
Do céu de minha terra;

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ººLira dos Vinte Anos - Ateliê Editorial

Capa e frontispício: Luciana Rochaºº

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Gosto muito do início de "Na Minha Terra" do poeta Álvares de Azevedo. Teve inspiração na natureza, das coisas mais singelas (os cheiro das flores, os sons da viola) às mais taciturnas (noite sussurrante, véu da escuridão).

Quase se pode pensar que o mesmo olhar que admira as belezas da terra, que não deixam de inspirar amor e volúpia, também admira o mistério dos mantos nebulosos, das névoas, da escuridão. No entanto, mesmo nas passagens onde cita o 'verão', 'flores', 'azul', 'praia' que podem ser símbolos de felicidade, o verão é tardio, a névoa acompanha as flores, o céu azul é coberto por um manto nebuloso e a praia é macilenta.
Nos 4 primeiros versos, Azevedo se utiliza de aliterações que valorizam o efeito de sentido: 'sussurrante', no primeiro verso. O uso do 's' aqui produz o efeito expirado que anuncia o vento que passará pelos 'pinheiroS' e tropeiroS'; a conseqüência disso é refletida pelo uso de "tr" em 'tremer' e 'tropeiros', assim, o vento vibra, estremece. O 't', que é ocluviso e explosivo, juntamente com o 'r' produz um efeito sinestésico auditivo e tátil.
Nos versos da segunda estrofe, no entanto, o uso da assonância da vogal 'o' e das rimas 'ão' produzem outro efeito: o do encerramento, do fechar-se em si, do eu, do interno, do breu. "Os mOnÓtOnOs sOns'; 'nO'; 'tardiO'; 'verÃO'; 'escuridÃO'. A vogal 'o', nessas palavras, é fechada e o 'ão' salienta ainda mais o sentido de que o eu-lírico pode se remeter a seu interior soturno, e os 'monótonos sons de uma viola' se encerram em si, não se extendem, não gritam, não se expandem.
Ao longo do poema há mais exemplos interessantes que denotam seu amor por sua 'terra sombria', que é sempre bela.


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